Quando eu era mais nova e ouvi a expressão “a última bolacha do pacote” pela primeira vez, a minha imaginação foi imediatamente para o espaço de interpretação do que para mim seria a última bolacha, esmigalhada, esquecida e eventualmente até apodrecendo no fundo pacote. Lembro daqueles pacotes de plástico sem potencial de reciclagem que tinham uma fita para abrir de um lado e vez ou outra alguma bolacha emperrava no fundo e quebrava nas bordas, ou completamente. É tudo uma questão de interpretação e referencial. Mas vejo agora muita gente querendo ser autoridade em alguma área (principalmente no meio artístico/ cultural) e se colocando como se fosse detentora da principal experiência naquele campo, ou responsável pelas únicas reflexões que valem a pena ser ouvidas.
O campo editorial, assim como diversos outros, é composto por muitas camadas, existem diferentes intenções, perspectivas e possibilidades e isso pode ser muito bacana, contanto que seja compreendido e valorizado. E vale sempre lembrar daquela indicação de conferir mais de duas fontes e construir um referencial múltiplo, muito difícil de se conquistar apenas por mídias aceleradas e partilhas pontuais.
Na metade de fevereiro eu fui em um evento para celebrar o aniversário de uma editora. Sim, uma editora independente que publica poesia e prosa e tem um catálogo enorme de títulos. Conheci de fato o trabalho deles em uma feira literária e fiz um acompanhamento para editores que eles ofereceram alguns meses atrás, foi um processo que deu muito impulso para a minha segunda publicação ganhar forma. E o evento aconteceu em uma livraria ligada a editora e que por isso mesmo carrega um acervo recheado de títulos nacionais independentes, um ótimo espaço para conhecer quem está estreando no universo literário, contemplar lançamentos, conhecer obras fora das listas convencionais.
Ainda no tópico livrarias de rua, estes dias eu fui encomendar um presente em uma e acabei contemplando uma apresentação de chorinho que rola ali todo mês, uma ótima forma de passar uma tarde com aquelas ameaças de chuva, ou calor extremo. São espaços assim que acolhem eventos culturais, muitas vezes gratuitos, e nos oferecem uma alternativa ao asfalto quente, ou mesmo a locais excessivamente consumistas, com luzes desconfortáveis, aromas exagerados e trânsito de pessoas. É importante a gente lembrar disso, mesmo que comprar online pareça mais conveniente.
E voltando ao tema das bolachas, mês passado eu fui contemplar uma edição de feira vegana que acontece mensalmente em SP (e se você esta pela cidade recomendo conhecer, são diversos expositores de setores como vestuário, cosmética, ongs e claro, o forte é comida, muita variedade), tive ali a oportunidade de provar um doce amanteigado caseiro de uma confeiteira. Imediatamente fui transportada para anos atrás, quando fui surpreendida por uma feira enquanto passeava em cidade de montanha e lá entre os expositores de artesanato, produções manuais e caseiras estava uma banquinha com doces super aconchegantes no tempo frio. Na verdade são alimentos diferentes, porque o anterior tinha cobertura e se não me engano especiarias. Mas até recentemente eu não havia provado nada parecido nesse senso de acolhimento, de textura leve, simples e maravilhoso (é da Veganlume, que tem outras delícias, nem tem ideia de que eu estou escrevendo isso e não achei site, só pagina de mídias). Essa dinâmica me lembrou que além desse processo curioso de memórias e associações, mesmo que leve tempo e exija uma nova configuração, podemos retomar boas experiências, inclusive em ambientes inesperados.
E com essa reflexão eu concluo a partilha desse carnaval. Espero que tenha se divertido, ou descansado nesse feriado e torcido/ celebrado a conquista do primeiro Oscar brasileiro! Eu nem havia acompanhando as cerimônias nos anos anteriores (mesmo tendo graduação em cine) e tem bastante coisa lá que nem faz mais sentido (se é que já fez), mas celebrar o cinema nacional é importante.
Valeu pela companhia e até logo mais!
No período de escrita desta edição:
🎶Ouvindo Anavitória, e Alberto Rosenblit (instrumental)
📚Lendo “Somos Animais Poéticos” da Michèle Petit – editora 34
Livrarias mencionadas: Patuscada e Bandolim
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